sexta-feira, 22 de junho de 2012

Hulk e Wolverine: A Fera Interior

Por que o Incrível Hulk e o Wolverine são tão populares?
Porque eles tornam explícito algo que é comum a todos nós; a luta contra nossa fera interior.

Wolverine e Hulk já se defrontaram várias vezes

O Hulk foi criado por Stan Lee e Jack Kirby em 1962. Lee conta que se inspirou na literatura para criar seu drama: mais especificamente, nos romances Frankestein, de Mary Shelley, e O Médico e o Monstro, de Robert Louis Stevenson. Todo mundo conhece a história: após a explosão de uma bomba gama, o franzino cientista Bruce Banner se transforma, em momentos de raiva, no monstro verde (às vezes cinza) Hulk. O Hulk, à semelhança do monstro de Frankenstein, não é exatamente mau: apenas quer ser deixado em paz. Porém sua ira é incontrolável e sua grande força faz muitos estragos em propriedades. Quase sempre, o Hulk acaba protegendo a humanidade, derrotando monstros realmente malignos. Porém, isso não impede que os "homenzinhos" (o exército, a polícia) fiquem na cola dele. Bruce Banner, o "médico" dessa equação, tenta a todo custo suprimir ou se livrar de seu monstro. Durante os últimos 50 anos, milhares de fãs têm acompanhado suas tentativas frustradas de controlar o que não pode ser controlado.

O "Golias Esmeralda"

Wolverine surgiu nos quadrinhos em 1974, com roteiros de Len Wein e desenhos de Herb Trimpe, coincidentemente, em uma história do Hulk. James Howlett, conhecido da maioria das pessoas como Logan, é um mutante com mais de um século de idade, com sentidos aguçados como os de um animal e um fator de cura que o torna praticamente imortal. A vida de Logan é marcada pela tragédia desde cedo, tendo visto a crueldade de muitas guerras. Na idade adulta, foi capturado por um projeto secreto do governo chamado Arma X. Neste projeto, enxertaram em seus ossos o metal indestrutível adamantium, o que fez ele se tornar um soldado ainda mais mortífero. Logan escapou do projeto e ficou perambulando pelas matas canadenses, vivendo como um animal, até ser encontrado por um casal que cuidou dele. Mais tarde ele se tornaria agente do serviço secreto canadense, e depois, membro dos X-Men. Wolverine é geralmente apresentado como um selvagem violento, que mata primeiro e pergunta depois. Quando se conhece melhor o personagem, percebe-se que na verdade ele luta para ser diferente. Seu sonho é ser honrado e sereno como um guerreiro samurai. Porém, muitas vezes em meio às batalhas, o herói não consegue conter sua sede de sangue.
O "Baixinho Invocado"

É justamente essa luta que Banner/Hulk e Logan/Wolverine travam todos os dias que faz com que milhares de fãs se identifiquem. Afinal, todos nós já nos sentimos assim. Em vários momentos de nossas vidas, nos descontrolamos, "explodimos" e machucamos pessoas ao nosso redor. Quem sabe o que faríamos se tivéssemos garras de metal nos braços ou a força para derrubar prédios? Quando a fúria passa, nos arrependemos, mas o estrago já foi feito. Prometemos a nós mesmos que vamos nos controlar, mas antes que possamos perceber, a fera interior dá às caras novamente.

A perda de controle

E isso não acontece apenas com a falta de controle da ira. Várias atitudes negativas voltam a nos atacar repetidamente: inveja, ciúme, luxúria, cobiça, mentira, egoísmo, preguiça, indiferença, amargura... A cada manhã prometemos a nós mesmos que seremos pessoas melhores, e ao fim do dia, percebemos que o monstro despertou mais uma vez. Ao pensarmos que um dia teremos de dar contas de nossas vidas a um Deus pessoal e justo, mal conseguimos disfarçar o medo de seu julgamento, pois sabemos o quanto estamos longe de seu padrão.

O Apóstolo Paulo fala sobre isso em sua carta aos Romanos, capítulo 7, versículos 15 a 21:

Não entendo o que faço. Pois não faço o que desejo, mas o que odeio. E, se faço o que não desejo, admito que a Lei é boa. Neste caso, não sou eu mais quem o faz, mas o pecado que habita em mim. Sei que nada de bom habita em mim, isto é, em minha carne. Porque tenho o desejo de fazer o que é bom, mas não consigo realizá-lo. Pois o que faço não é o bem que desejo, mas o mal que não quero fazer, este continuo fazendo. Ora, se faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, mas o pecado que habita em mim. Assim, encontro esta lei que atua em mim: Quando quero fazer o bem, o mal está junto a mim.

Que declaração honesta e sofrida! No entanto, ela revela a verdade sobre o ser humano muito melhor do que qualquer sistema teológico ou filosófico. Muitas teorias surgiram para afirmar que o homem é intrinsecamente bom; o que o corrompe é a sociedade ou a ignorância. Rosseau é o exemplo clássico disso, e até hoje muitos concordam com ele. O pensamento bíblico é claro: o ser humano é mau desde sua concepção. Ele herdou uma tendência para o egoísmo, para fugir do verdadeiro amor e se voltar para si mesmo. Os teólogos chamam essa tendência inata de "pecado original". Curiosamente, Sigmund Freud, famoso por sua militância contra o cristianismo, tinha uma postura parecida: o homem já nasce com um "defeito de fábrica"; tem uma personalidade cindida e é intrinsecamente egoísta, ciumento e violento, sendo que a sociedade e a cultura ajudam como podem a conter essas pulsões primitivas, não sem graves conseqüências.
Jean-Jacques Rosseau: "O homem é bom"

Sigmund Freud: "O homem é mau"

Qual seria então, a saída? Simplesmente entender que somos assim mesmo, e tocar o barco? Parece ser essa a solução que Banner encontra no filme Vingadores: pouco antes do clímax, o doutor revela qual o segredo para controlar sua transformação: "Eu estou sempre com raiva". A saída seria então, assumir e aceitar esse lado sombrio de nossa personalidade, para que ele não nos controle? Jung defende essa posição, em seus estudos sobre a sombra, o lado obscuro de nós mesmos, que deve ser aceito, compreendido e integrado para uma saúde psíquica.

Carl Gustav Jung: "Aceitar a própria sombra"


O Evangelho, no entanto, apresenta uma outra possibilidade. Não precisamos entrar em desespero com nossas faltas, num perfeccionismo neurótico que não leva a lugar nenhum. Também não precisamos nos conformar com nossas imperfeições, numa atitude conhecida como Síndrome de Gabriela: ("Eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim...") rsrsrsr. De que maneira devemos lidar com nossa fera interior?

1. Entender e aceitar a graça de Deus: Jesus Cristo, na cruz, pagou o preço de nossas atitudes egoístas (em termos técnicos teológicos, ele fez propiciação por nossos pecados). Cristo assumiu nossa natureza humana para levar em seu corpo os pecados de toda a humanidade, e dessa forma cancelar a dívida que todos nós tínhamos perante a Justiça Divina.  Dessa forma, todo aquele que crê em Cristo está justificado aos olhos de Deus. Seus pecados foram lavados, perdoados e esquecidos. Não precisamos fazer nada para merecer o perdão e o amor de Deus; apenas crer em seu Filho. Esta compreensão nos livra de toda ansiedade e angústia em relação aos nossos delitos. Tudo já foi pago. Tudo já foi perdoado. Quem está em Cristo está livre da condenação.

2. Produzir o fruto do Espírito: A graça que perdoa é a mesma graça que transforma. A pessoa que vive em relacionamento vital com Cristo (em termos técnicos, alguém "nascido de novo"), possui agora uma nova natureza, que se opõe ao pecado e vive para amar. Esta nova natureza é de ordem espiritual, sobrenatural; não pode ser promovida e mantida pela força de vontade humana. Você precisa depender de Deus para viver como Deus quer. Jesus explicou essa situação comparando a si mesmo com uma videira e nós como os ramos dessa videira. Para produzir fruto (o fruto do Espírito, que é amor, paz, alegria, bondade, domínio próprio, etc.) é preciso estar ligado a Jesus, buscando o enchimento do Espírito Santo a cada dia.

A fera interior continua existindo. A recomendação bíblica é para vigiarmos e orarmos, para não entrarmos em tentação. Só ficaremos totalmente livres do monstro no Novo céu e na Nova Terra, quando seremos transformados à semelhança de Cristo. Até lá, conscientes da graça de Deus, confiando que fomos aceitos em sua família, contamos com o Espírito do próprio Deus para mantermos nossas garras guardadas.


sábado, 9 de junho de 2012

O que é a Matrix?



Morpheus: A Matrix está em todo lugar. À nossa volta. Mesmo agora, nesta sala. Você pode vê-la quando olha pela janela, ou quando liga sua televisão. Você a sente quando vai para o trabalho... quando vai à igreja... quando paga seus impostos. É o mundo que foi colocado diante de seus olhos para que você não visse a verdade.
Neo: Que verdade?
Morpheus: Que você é um escravo.


Jesus: E conhecerão a verdade, e a verdade os libertará.

Lembro claramente do impacto que tive ao assistir Matrix pela primeira vez. Além de ser o filme de ação mais acachapante que eu já vira, as acaloradas discussões filosóficas com colegas (e até professores) de faculdade estenderam-se por meses a fio. O que á a Matrix? A pergunta já suscitou muitas respostas: é a ideologia capitalista que impregna as relações sociais; é maya, a falsa consciência de que alguma coisa é real, da qual se desperta com meditação; é a caverna da qual Platão falou, da qual ninguém sai impunemente... Quero nesse artigo analisar a Matrix de um ponto de vista cristão.

A Alegoria da caverna de Platão

O cristianismo também trabalha com o conceito de um sistema que existe para dissimular a verdade e escravizar as pessoas. O apóstolo João escreve em sua primeira carta:
"Não amem o mundo, nem o que nele há. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele. Pois tudo o que há no mundo - a cobiça da carne, a cobiça dos olhos e a ostentação dos bens - não provém do Pai, mas do mundo. O mundo e sua cobiça passam, mas aquele que faz a vontade de Deus permanece para sempre." (1 Carta de João, capítulo 2, versículos 15-17)



O uso da palavra "mundo" por João tem sido mal-entendido por muitos. Gerações e gerações entenderam que o cristão não deveria ter amor pelo planeta, pela criação de Deus, ou ainda, que para amar a Deus é necessário odiar os seres humanos. Essa interpretação é absurda, pois o próprio João escreveu em seu Evangelho que "Deus amou o mundo" (Capítulo 3, versículo 16).
O texto bíblico refere-se ao que eu chamo de Anti-Reino, o sistema criado pela humanidade rebelada contra os valores de Deus, sistema esse que valoriza como fins em si mesmos o prazer (cobiça da carne), o consumo (cobiça dos olhos) e a vaidade (ostentação dos bens), e considera como insignificantes e/ou impraticáveis os valores do Reino de Deus, aqueles ensinados por Jesus nos Sermão do Monte. O Anti-Reino mascara a realidade de que a fé é mais potente que o cinismo, que a esperança é mais forte que o medo e de que o amor é mais invencível que a morte. Ele faz muitos permanecerem adormecidos, tal qual na Matrix, imaginando que "o mundo é assim mesmo e não adianta querer ser diferente".


Quando alguém ouve o chamado para seguir a Jesus, ocorre um despertar semelhante ao de Neo: ele descobre que foi enganado a vida inteira, que o mundo não é da maneira como foi ensinado. Esse despertar pode ser gradual ou súbito, mas é sempre, de alguma forma, traumático. A pessoa entende que não dá mais pra viver da mesma forma que vivia. Foi marcado. Não é mais "do mundo". Ele passa a dizer como o poeta hebreu: "Tenho vivido tempo demais entre aqueles que odeiam a paz. Sou um homem de paz, eles só falam de guerra." (Salmo 120: 6-7).
Tal como Neo, o discípulo despertado passa por muitas lutas. O sistema passa a ser seu inimigo, e fará tudo para reassimilá-lo ou destruí-lo. Às vezes até se questiona se não seria melhor ter continuado no seu mundinho de faz-de-conta. Mas ele sabe que não. Ele foi definido, marcado, pelo chamado que recebeu. Foi atraído, despertado e seduzido pela Verdade.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Desafio Infinito: os Vingadores e a luta contra a Morte!



Os nerds foram à loucura ao final do filme Os Vingadores, quando se revela uma figura sombria e misteriosa que estava por trás dos ataques feitos à Terra. Qual o motivo de tanta euforia? Quem é este ser, e porque ele representa tamanha ameaça?


"O nome dele é Thanos", e é um dos personagens mais emblemáticos e interessantes da Editora Marvel. Quando foi criado, em 1973, ele não parecia muito diferente dos demais vilões alienígenas com desejo de conquistar o mundo. Aos poucos, porém, seu criador Jim Starlin foi revelando suas características únicas. A principal motivação de Thanos em realizar seus planos maquiavélicos não é o simples desejo de poder, arrogância ou desprezo pela humanidade (embora ele possua tudo isso). Thanos faz o que faz porque é APAIXONADO... pela Morte!



Isso mesmo! A musa inspiradora de Thanos é a própria Morte, aquela senhora com foice e cara de caveira! Tudo o que o alienígena faz é por amor! Desde jovem ele busca impressionar sua amada. Em uma das maiores sagas da Marvel, Desafio Infinito, Thanos toma posse de seis joias especiais que dão a ele controle sobre o tempo, espaço, poder, mente, espírito e realidade. Com essas armas tão poderosas, num simples estalar de dedos, ele elimina metade da população do universo!


Os Vingadores unem-se a outros heróis e partem pra cima do vilão numa batalha épica.  Thanos vai derrotando os Vingadores um por um, como por exemplo transformando o corpo de Thor em vidro e despedaçando-o! Que esperança poderiam ter os heróis contra um inimigo tão poderoso? É exatamente isso que ele pergunta a um combalido Capitão América em determinado momento (Faz muito tempo que li essa história, e a memória pode estar me falhando, mas em minha memória afetiva o diálogo é mais ou menos assim):

Thanos: "Por que vocês insistem em lutar? Não sabem que já estão derrotados? A morte é definitiva e inescapável. Tudo que vive um dia vai morrer!"

Capitão América: "Não importa. Nós lutamos pelo que há de mais precioso: pela vida! Enquanto houver um fôlego de vida em nós, mesmo contra todas as esperanças, lutaremos. Nunca desistiremos de lutar contra a morte!"


Ao final do arco, após muita luta o bem prevalece, e tudo volta a ser como era antes de Thanos tomar posse das joias do infinito. O personagem voltaria a aparecer outras vezes, algumas como vilão e outras como relutante herói, até finalmente poder descansar nos braços de sua amada (por enquanto).

O que me chamou a atenção em Desafio Infinito foi justamente essa determinação em lutar pela vida por parte dos Vingadores. Eles encaravam a morte como o supremo inimigo, aquele que deveria ser combatido a todo o custo.

E isso tem tudo a ver com o cristianismo.

É claro, existem outras religiões que vêem a morte de uma maneira diferente; como uma aliada, uma amiga, até mesmo uma irmã. Para muitos religiosos, a morte não apenas é uma fase natural do ciclo da vida como transição indispensável para a evolução espiritual. O catolicismo romano, especialmente durante a época medieval, tem essa teologia. Mas a bíblia apresenta a Morte como um inimigo a ser derrotado:

O último inimigo a ser destruído é a morte (1 Coríntios 15:26)



Na visão do cristianismo bíblico, Deus é o autor e fonte da vida. Ele criou a humanidade para viver de maneira plena. A morte passou a fazer parte da existência humana a partir do momento em que as pessoas se afastaram de Deus. Desde então, Deus instituiu seu plano para conceder vida através de seu Messias, Jesus, que ao morrer e ressuscitar, derrotou a morte.

A esperança do cristão não é uma existência como espírito desencarnado numa dimensão espiritual chamada Céu. Esperamos pela ressurreição de nossos corpos quando Jesus voltar. Loucura? Já vi gente acreditando em coisas bem mais loucas. "Por que os senhores acham impossível que Deus ressuscite os mortos?" (Apóstolo Paulo, em Atos 26:8). Nossa luta contra a morte não é desesperada; sabemos que, ao contrário das aparências, ela é um inimigo derrotado.

Essa concepção da vida e da morte leva os cristãos a compromissos práticos em nossa agenda pró-vida. Um desses compromissos é a luta contra o aborto.


Entendemos que a vida começa no instante da concepção (e não há nenhum argumento sólido filosófico e científico contra isso). Como a vida é preciosa e a morte é o inimigo, combateremos até o fim essa prática abominável, que em nada difere do infanticídio. Não é uma questão dos direitos da mulher: é uma questão do direito do feto à vida. E não adianta falar que a proibição do aborto conduz à perigosa prática dos abortos clandestinos. Nós cristãos somos contra os abortos clandestinos também.


Outra questão polêmica é a da pena de morte. Não consigo entender como alguns cristãos, que lutam contra o aborto por causa do valor da vida, apoiam a pena de morte! O princípio é o mesmo! Alguns dizem que no Antigo Testamento Deus estabeleceu a pena de morte. Exato. No Antigo Testamento. É preciso notar que, à luz da teologia, todos nós merecemos a pena de morte. Mas a graça de Jesus veio para nos dar vida e inaugurar uma nova era de perdão. Passagens bíblicas como Romanos 13:4, a meu entender, falam apenas da autoridade do Estado em portar armas (espada) para manter a ordem; não uma autorização para o Estado usar a espada.

Poderia ainda falar sobre eutanásia, guerra, suicídio e outros assuntos, mas acho que já pude me fazer entender. Temos um Deus que é pró-vida de maneira radical. A Morte é uma inimiga, não uma aliada. Uma inimiga temível, assustadora. Uma inimiga que deve ser combatida até nosso último suspiro, como disse o Capitão América. Felizmente, é uma inimiga já derrotada, e eu estou no aguardo desse dia glorioso em que "não haverá mais morte, nem tristeza, nem choro, nem dor, pois a antiga ordem já passou" (Apocalipse 21:4)